sábado, 2 de julho de 2011

Texto - ZUKIN; Sharon. Paisagens urbanas pós-modernas: mapeando cultura e poder

Um dos trabalhos centrais é o da socióloga Sharon Zukin, do Brooklin College e da City University of New York, que comparece com dois textos na coletânea. Em "Paisagens urbanas pós modernas: mapeando cultura e poder", Zukin descreve, a partir de uma distinção entre "paisagem" e "vernacular", dois processos de relações entre cultura e poder observáveis no cenário urbano pós-moderno. No que ela classifica de "antigas cidades modernas", como Nova York, Chicago, Londres ou Paris, um desses processos é denominado "enobrecimento" (gentrification) e se caracteriza pela substituição, nos velhos centros decadentes, dos antigos moradores (e seu estilo vernacular) por novos personagens e atividades culturalmente valorizadas. Já em cidades como Los Angeles, Miami, Houston ("novas cidades modernas") o processo de valorização é resultado de outro padrão, como a construção de vastos complexos de consumo explorando a fantasia e o sonho, no estilo Disneyworld.

"Paisagens urbanas pós-modernas: mapeando cultura e poder", Zukin descreve, a partir de uma distinção entre "paisagem" e "vernacular", dois processos de relações entre cultura e poder observáveis no cenário urbano pós-moderno. No que ela classifica de "antigas cidades modernas", como Nova York, Chicago, Londres ou Paris, um desses processos é denominado "enobrecimento" (gentrification) e se caracteriza pela substituição, nos velhos centros decadentes, dos antigos moradores (e seu estilo vernacular) por novos personagens e atividades culturalmente valorizadas. Já em cidades como Los Angeles, Miami, Houston ("novas cidades modernas") o processo de valorização é resultado de outro padrão, como a construção de vastos complexos de consumo explorando a fantasia e o sonho, no estilo Disneyworld.

O texto refere-se à Paisagem urbana pós-moderna, (ressalta-se a imprecisão do termo, devido a dificuldade de como delimitar esse novo estágio relacionado ao conceito de liminaridade proposto pela própria autora que será discutido adiante, no entanto o mesmo reúne e avalia as conjunturas de mudanças espaciais, culturais e sociais).
”. [...] a pós-modernidade ocorre como um processo social de dissolução e rediferenciação e como uma metáfora cultural dessa experiência. Consequentemente, o processo social de construção de uma paisagem pós-moderna depende da fragmentação econômica das antigas solidariedades urbanas e de uma reintegração que é fortemente matizada pelas novas formas de apropriação cultural (p. 81).

A autora apresenta algumas características dessas mudanças espaciais:
· Consumo visual de espaço e tempo;
· Dissolução das identidades espaciais;
· Fragmentação econômica das antigas solidariedades urbanas;
· Reintegração fortemente matizada das novas formas de apropriação cultural;

Para Sharon Zukin existe uma inversão de paradigmas da narrativa pós-moderna. A razão da sociedade moderna se concretiza na forma como a sociedade se organiza. Nas cidades pós-modernas há uma alteração de uma ordenação, a imagem nem sempre corresponde, reflete a realidade da sociedade. Podemos analisar um desses exemplos na própria cidade do Rio de Janeiro, como edifício inteligente Rio Branco I, em contraposição a arquitetura moderna da cidade.

[...] Os sítios específicos da cidade moderna são transformados em espaços liminares pós-modernos, que tanto falseiam como fazem a mediação entre natureza e artefato, uso público e valor privado, mercado global e lugar específico. Liminaridade [...] um novo significado social e cultural de “espaços transicional”. [...] um espaço liminar situa o usuário “a meio caminho” entre instituições. O comportamento aprendido é sempre posto em questão quando a liminaridade cruza lugares lucrativos como não lucrativos, casa com espaços de trabalho, bairro (residencial) com centro (comercial) (p.82).
A liminaridade dificulta o esforço de construção de uma identidade espacial. As mesmas características que tornam os espaços liminares tão atraentes, tão competitivos em uma economia de mercado, representam também o desgaste da diferenciação local. As fontes dessa erosão encontram-se em três amplos processos de mudança que atravessam o século XX: a crescente globalização do investimento e da produção, a abstração contínua do valor cultural em relação ao trabalho material e a mudança do significado social – que era extraído da produção e hoje deriva do consumo (p. 82).
[...] uma paisagem urbana pós-moderna não apenas mapeia cultura e poder: mapeia também a oposição entre mercado – as forças econômicas que desvinculam as pessoas de instituições sócias estabelecidas – e lugar – as formas espaciais que as ancoram no mundo social, proporcionando a base para uma identidade estável (p.83).

A paisagem como apropriação cultural
Paisagem é o conceito-chave para compreendermos a transformação espacial (p.83).
[...] a paisagem é claramente uma ordem espacial imposta ao ambiente – construído ou natural. Portanto, ela é sempre socialmente construída: é edificada em torno de instituições sociais dominantes (a igreja, o latifúndio, a fábrica, a franquia corporativa) e ordenada pelo poder dessas instituições (p.84).
[...] a paisagem dá forma material a uma assimetria entre o poder econômico e o cultural. [...] o termo “paisagem” diz respeito à chancela especial de instituições dominantes na topografia natural e no terreno social, bem como a todo o conjunto do ambiente construído, gerenciado ou reformulado de algum modo. No primeiro sentido, a paisagem dos poderosos se opõe claramente à chancela dos sem poder – ou seja, à construção social que escolhemos chamar de vernacular –, ao passo que a segunda acepção de “paisagem” combina esses impulsos antitéticos em uma visão única e coerente no conjunto (p.84).
A pós-modernidade diz respeito à recente inversão das identidades socioespaciais entre paisagem e vernacular que tais mudanças implicam. Com o enobrecimento e as novas construções nos velhos centros das cidades, o que restou da residência unifamiliar particularmente arruinada, vernacular, é revisto como paisagem e investido de poder cultural (p.87).
Enobrecimento
Mesmo nos estágios preliminares do enobrecimento, a apropriação cultural é um processo que se dá em duas etapas. Primeiramente, um grupo social não relacionado de modo nativo à paisagem ou ao vernacular assume uma perspectiva de ambos. Em segundo lugar, a imposição de sua visão – convertendo o vernacular em paisagem – conduz a um processo material de apropriação espacial (p.89).
Nesse ponto, a apropriação cultural chega a um dilema. De um lado, a aura do conjunto será arruinada pelo contínuo desenvestimento econômico. Mas, de outro, ela será inundada por um influxo de capital, com o conseqüente risco de novas construções a seu redor. A substituição da população dos distritos centrais de classe baixa por “nobre” é, hoje, algo bem conhecido, ainda que os recém-chegados possam eventualmente desenvolver – dentro de limites culturais – uma variedade de estilos empobrecidos ou chiques (p.89).
Paisagem de sonho
O paradigma de James, de uma civilização de hotel, e a descrição de Banham, de uma arquitetura de fantasia, sugerem três elementos de uma paisagem pós-moderna extra-urbana: é um cenário, uma fantasia particular compartilhada e um espaço liminar que faz a mediação entre natureza e artifícios, mercado e lugar (p.91).
Esses três elementos ganham plena liberdade de ação na paisagem do Disney World, Como paisagem da pós-modernidade, ele incorpora um cenário ao mundo “real” do turista, ao mesmo tempo em que afasta esse cenário dos assuntos diários de trabalho, casa, família, trânsito engarrafado e orçamentos domésticos. Além disso, o Disney World desenvolve-se com base na comercialização da fantasia privada compartilhada (que tem origem em contos de fada, sonhos de aventura e fronteira e produtos do Estúdio Disney), e se expande por uma mediação contínua dessa fantasia através de novas aventuras, parques temáticos e produtos em rotação (p.91).
[...] o Disney World foi construído para consumo visual. Ele oferece um panorama e uma colagem da pós-modernidade. A variedade de conjuntos ou parques temáticos permite uma visão simultânea de paisagens reais e fictícias, algumas das quais são imaginativas recriações históricas e outras, puramente imaginárias (p.92).
Disney World apresenta o consumo seletivo do tempo como entretenimento. Ele abstrai uma imagem do desejo e do prazer infantis a partir do vernacular, e a projeta mediante a paisagem de um parque de diversões. A abstração do desejo torna-se o “recheio”, a isca comercial que os donos dos parques de diversões embutem em suas atrações (p.92).
David Harvey enfatiza o processo de acumulação flexível. Defende a ideia de que a arquitetura e o projeto urbano cria condições para um “mundo de ilusões”, a criação de espaços íntimos e grandes espetáculos. A forma como a cidade é apresentada muitas vezes se ressalta seu processo histórico na construção de grandes monumentos e a sua utilização de forma mercantilizada.

Referência:
ZUKIN, Sharon. Paisagens urbanas pós-modernas: mapeando cultura e poder. In Arantes, Antônio Augusto (org). O espaço da diferença. Campinas, Papirus, 2000.pp 80-103.

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